domingo, 17 de setembro de 2017

Therion - Sitra Ahra / Segredos e Curiosidades

Nesta matéria vamos buscar desvendar um pouco do que envolve o até então último trabalho de inéditas do Therion, intitulado “Sitra Ahra”, e pincelar levemente outras referências que aparecem em alguns dos álbuns anteriores que, até mesmo, apresentam algumas invocações realizadas nos rituais da Dragon Rouge. A matéria tem muita informação condensada que pode valer a pena ser lida mais de uma vez para uma melhor assimilação, caso o leitor se interesse mais.

O álbum abre com a faixa título falando sobre o outro mundo, o “Outro Lado”, ou seja, “Sitra Ahra” (em hebraico), presente também na música “Nightside of Eden”, do álbum “Theli”. Mas esse “Outro Lado” não é meramente o Além, o mundo dos espíritos dos mortos, mas sim um universo primordial, um universo caótico pré-cósmico que antecede a existência do universo conhecido, este último representado pela Árvore da Vida cabalística conhecida como Árvore Sephirótica (aquele famoso diagrama com dez círculos visíveis e um “invisível” e suas interligações, representando planos e níveis psicomentais e espirituais cósmicos). Por outro lado, Sitra Ahra, o “Outro Lado”, tem sua representação na Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal, chamada de Árvore Qliphótica (há uma referência a essa Árvore também na música “Lepaca Kliffoth”, do álbum homônimo). É essa Árvore do Conhecimento que é mencionada na letra da música “Sitra Ahra” logo no início: “Tree of disbelief (...)”; é a essa Árvore que a letra se refere quando diz “Pass to the sea of darkness/ to another world (...) Join me to the Other Side/ The Nightside of the Paradise”. O diagrama dessa Árvore Qliphótica aparece na horizontal, com seus onze círculos qliphóticos e uma concha na extremidade, na capa de “Sitra Ahra”. Conchas são também todas as onze esferas do diagrama, referidas na letra da música “The Shells Are Open”, do “Sitra Ahra”.

A capa de “Sitra Ahra” é muito interessante e enigmática para aqueles que conhecem e também para aqueles que ainda não conhecem a temática do THERION e a filosofia oculta da Dragon Rouge. A Árvore que aparece na ilustração do álbum, como mencionado, é a Árvore Qliphótica de maneira invertida, ou seja, o mundo de Sitra Ahra. O círculo dessa Árvore do Conhecimento que está em primeiro plano com a concha representa a qlipha chamada Thaumiel – na Árvore da Vida, é a sephira (“emanação”) Kether (“Coroa”). A "flor" que surge da qlipha Thaumiel é uma flor e é uma concha (que significa "qlipha", em hebraico, singular de “qliphoth”). Como flor, representa o chakra Sunya (“Vazio”), que está além do chakra da coroa (o conhecido Sahashara), acima da cabeça humana (chakras – “rodas”, em sânscrito – são centros energéticos na anatomia oculta humana). Dessa "concha-flor" o que surge é uma pedra bruta conhecida como Diamante Negro (“Black Diamond”, do álbum “Vovin”, e da música “In the Desert of Set”, do “Theli”), que é uma outra representação do chakra negro Sunya. Sunya é o “Vazio” que Tudo contém, paradoxalmente, e é chamado também de Olho do Dragão, Olho de Set, Olho de Lúcifer e Olho de Shiva (o que é evidente nas músicas “Emerald Crown”, do álbum “Deggial”, e “Eye of Shiva”, do álbum “Vovin”). Esse Olho, quando aberto, significa a destruição de toda Ilusão do cosmos, do universo manifestado criado por uma entidade chamada Demiurgo, um deus de restrição, estagnação e escravidão. Essa destruição da Ilusão (Maya) e da personalidade egoica possibilita a assimilação e experiência individual do Real na primeva Noite anticósmica, em seu sentido supra-físico, que pode ser acessada por meio de certas técnicas e “chaves” (isso é referido na música “Clavicula Nox”, “Chave da Noite”, do álbum “Vovin”).


Considerando-se a interessante temática "theriônica", o leitor já deve ter percebido que Sitra Ahra é um mundo sinistro e aparentemente distante... Mas não necessariamente maléfico, como se poderia imaginar equivocadamente. Sitra Ahra, o “Outro Lado”, o “Lado Sinistro”, é o Reino das Trevas que precedem a Luz da Criação. É o reino da deusa sinistra Lilith, citada na letra da música “Sitra Ahra” como a “Rainha das Qelipot”, sendo o mundo dos poderes femininos que criam do caos, que gestam a vida na escuridão; é o Útero de toda a vasta do universo manifestado e não manifestado, a fonte de toda a existência. Mitologicamente, Sitra Ahra é a “morada” das “deusas” Lilith, Kali, Hekate, Tiamat, etc., o lado noturno ou sinistro da “eterna” Sofia. Nesse sentido, outros nomes correspondentes a Sofia são Shekinah, Shakti, Vênus, Diana, Astaroth, Freja, entre outras, também mencionados ao longo das obras do THERION, em músicas como “Dark Princess Naamah” (do álbum “Symphony Masses”), “The Beauty in Black” (do “Lepaca Kliffoth”), “Invocation of Naamah” (do “Theli”), “Birth of Venus Illegitima” e “Morning Star” (do álbum “Vovin”), “Ship of Luna” e “Via Nocturna” (do “Deggial”), “Vanaheim”, (do “Secret of the Runes”), “Dark Venus Persephone” (do “Sirius B”), “The Perennial Sophia” e “Wisdom and the Cage” (do álbum “Gothic Kabbalah”).

No sistema aqui mostrado, Sofia se une à Luz de seu filho e esposo Lúcifer (“Portador da Luz”, em latim), no próprio indivíduo, por meio do fruto proibido (fruto também mencionado na letra de “Sitra Ahra”) para expandir a consciência que abarca o universo primordial pré-cósmico, onde está toda a sabedoria oculta cujos ínfimos fragmentos estão espalhados em nosso universo visível e material. Sitra Ahra é, portanto, o plano primeiro, o caos primordial (o “pandemônio” mencionado na letra da música) representado de maneira organizada pelos círculos da Árvore Qliphótica e pela estrela de onze pontas que também aparece em todos os álbuns do THERION desde o “Theli”. A organização do caos qliphótico em um diagrama ou mapa é necessária para estudo, compreensão e para a prática visando a acessar os reinos de Sitra Ahra.

 
Em nível meramente humano, Sitra Ahra é o reino do subconsciente no qual a sabedoria secreta (Sofia, etc) vem à consciência do indivíduo que atingiu a iluminação (Portador da Luz, Lux-ferre, o Daemon “socrático”, referido na música “Emerald Crown”, do álbum “Deggial”). Isso é mencionado na letra de “Sitra Ahra” como os “segredos revelados”. Essa iluminação só é possível com a “entrada” do “Ungido” no mundo de Sitra Ahra para “resgatar” a Sabedoria lá oculta nas Trevas, no “Lado Noturno do Paraíso” (conforme a letra da música também nos diz). Quer dizer, quando Lúcifer resgata sua esposa Sofia (Diana, Shakti, etc.) lá no “Outro Lado”, em Sitra Ahra. Mas o que é ser “ungido”, no contexto do Draconismo que permeia o THERION?

“Ungido” é todo aquele que desperta o Dragão-Serpente de Sabedoria, Leviathan, Kundalini, Theli (este último também referido no álbum de mesmo nome). Esse Dragão serpentino é a energia psicossexual que sobe até a cabeça e ilumina a consciência com um lampejo de sabedoria, manifestando o Anti-Logos Draconiano (a “voz da serpente”, conforme nos diz novamente a letra de “Sitra Ahra”). A unção serpentina e draconiana então “sacrifica” o corpo de Adam Belial, ou seja, o corpo do ser humano material se transforma fisica e fisiologicamente. Assim, o indivíduo se transforma no iniciado, tornase Ophis-Christos, Nachash-Messiah, ou, em outras palavras, “Serpente Ungida”, do grego/hebraico ophis/nachash (“serpente”) e christos/messiah (“ungido”), não tendo isso nada a ver com o famoso Jesus das massas. A Serpente Ungida é, portanto, o “Dragão” manifestado no indivíduo (“Vovin”, em língua enochiana, novamente referido em outro álbum do THERION). O iniciado então se converte no filho e amante de Sofia-Lilith, o verdadeiro Filósofo, Amante da Sabedoria (a “Perennial Sophia” do álbum “Gothic Kabbalah”).


Pelo que precede, Sitra Ahra é também o reino da Besta (“To Mega Therion”, “Deggial”, outras músicas da banda), a besta solar Sorath, filho e consorte da Sofia Ilegítima. É a Besta iniciadora, o “Dragão” mestre dos Mistérios das Trevas, Trevas onde a Sabedoria está oculta. Em Sitra Ahra, o conhecimento “proibido” e “inacessível” (o “fruto proibido” da música “Sitra Ahra”) pode ser buscado e é onde a Árvore do Conhecimento cresce. Simbolicamente, é essa árvore do Éden que possui os 11 frutos pertencentes a cada um dos Reis de Edom (outra música do álbum “Sitra Ahra”), os reis que governam cada uma das qliphoth de Sitra Ahra sob o poder de Shekinah, ou Sofia, a Sabedoria da Serpente do Éden, e o Dragão-Serpente Lúcifer-Vênus (Abzu-Tiamat, Samael-Lilith, também mencionados nas músicas do THERION). Nesse ponto, é facilmente notável uma aproximação entre os 11 frutos da Árvore do Paraíso, os 11 monstros gerados por Tiamat e os 11 reis de Sitra Ahra, o mundo da Magia Draconiana (cujo número-símbolo também é 11, o número da décima primeira esfera, ou concha qliphótica da Árvore). Onze é a redução de 218, a corrente anticósmica e caótica de Sitra Ahra, a corrente draconiana, e a síntese dos 11 reis de Edom, dos 11 monstros de Tiamat, dos 11 “demônios” das Qliphoth e da Árvore do Conhecimento, tudo isso por vezes chamado sinteticamente de Azerate por outras vertentes ocultas tais como o Templo da Luz Negra.

É importante mencionar também que a palavra “demônio” vem do grego “daemonos”, significando originalmente “espírito” ou “deus”, sem os conceitos populares de “bem” e “mal”, mas indiferente e isento de qualquer conotação moral religiosa ou pejorativa em voga. Ao longo da história, sabe-se que os “deuses” de um povo ou religião sempre se tornaram os “demônios” de outro povo ou religião... São conceitos realmente relativos...

A esta altura, já se pode ter um breve e “intrincado” vislumbre de toda a temática abordada nas letras do THERION, que para muitos são obscuras, incompreensíveis e talvez misteriosas... Mais uma vez, caso o leitor tenha mais interesse, é recomendável repetir a leitura de todo esse conteúdo para uma melhor assimilação.

No contexto theriônico aqui apresentado, a mera luz não é o bem absoluto e as trevas não são o mal absoluto; essa dicotomia absurda não existe na “vida prática” da natureza e do universo. O bem e mal como são conhecidos somente existem por meio dos atos humanos. E qualquer luz somente pode ser perceptível sobre o fundo negro das trevas essenciais. Luz, em nosso plano, significa manifestação do universo vísivel e da vida multifacetada em tons gradativos de luz e escuridão. Escuridão significa o universo invisível, o universo B, o Caos primordial de onde tudo surgiu. E, como toda moeda, um lado não pode existir sem o “outro lado” (Sitra Ahra)...


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